Popcafé #30: o novo disco "cinéfilo" de Sufjan Stevens e exploradores urbanos imperdíveis
Em jornada criativa curiosa, Sufjan Stevens e Angelo De Augustine entregam álbum com referências cinematográficas e de arte ganense.
O texto especial da newsletter de hoje é uma viagem particularmente curiosa - viagem no sentido imaginativo e exótico. Se Sufjan Stevens é um compositor que sempre reserva surpresas em suas abordagens musicais, dessa vez não foi diferente. Acontece que seu novo álbum, A Beginner’s Mind, é uma toca de coelho que começa em um processo criativo cinéfilo e acaba em cartazes de filmes antigos feitos por artistas ganenses - em abordagem quase inexplicável. Se você está lendo esse preâmbulo e pular o texto, vai chegar nos cartazes lá embaixo e dizer “o que é isso?!”, descobrindo que vai valer a pena ter lido todo texto - de preferência enquanto ouve o novo e ótimo álbum de Stevens.
Inspirado em filmes clássicos, Sufjan Stevens lança disco com experimentos criativos únicos
Sufjan Stevens é uma mente criativa incansável. Seja em jornadas permeadas pelo seu passado cristão (como em álbuns de canções de natal), na destreza narrativa de sua obra-prima Carrie & Lowell ou na trilha sonora de Me Chame Pelo Seu Nome, Stevens é prolífico como poucos. A cada semestre tem coisa nova em seu Spotify (além de um Tumblr - sim, um Tumblr - atualizado rotineiramente).
Ainda que conhecido como um cantor folk, sua discografia nega a alcunha veementemente. Stevens está no território experimental que coloca o violão acústico ao lado do eletrônico e new age - com alguma frequência em vertentes muitas vezes inclassificáveis.
E a novidade da vez é o épico experimento musical em parceria com Angelo De Augustine. A Beginner’s Mind se inspira em filmes escolhidos pelos compositores, inspirando-os em canções que se desenvolvem livremente, sem necessariamente falar diretamente da fita escolhida.
Essa livre-associação é um exercício criativo conhecido por poetas e publicitários e, não à toa, escolhido pela dupla na composição. Uma das influências foi a ferramenta Oblique Strategies, do famoso produtor Brian Eno (nome por trás de álbuns consagrados de David Bowie, U2 e Coldplay). Espécie de caixinha de “sorte do dia”, é composta por cartas com provocações que em certos contextos podem produzir novos caminhos criativos.
Mas como toda essa rota inusitada não é garantia nenhuma, é claro que Stevens e Augustine entregam um grande álbum. Remetendo bastante ao lado folk-experimental de ambos, A Beginner’s Mind se inspira em filmes como O Mágico de Oz, Silêncio dos Inocentes, O Enigma do Outro Mundo, A Malvada, Asas do Desejo, e assim segue por caminhos em que não necessariamente se encontrará referências diretas às obras.
O mais próximo de uma relação visual com esses filmes talvez sejam as exóticas capas dos singles e do álbum. Feitas pelo artista Daniel Anum Jasper, de Gana, remetem ao movimento de cinema móvel que aconteceu no país nos anos 1980 e que produzia cartazes das vitas VHS exibidas sem os artistas receberem informações completas sobre os mesmos.
Assim, uma série de pôsteres violentos ou sexualizados eram produzidos - sem que necessariamente existam tais temáticas no filme. É o caso de Uma Babá Quase Perfeita, clássico da Sessão da Tarde com Robin Williams:
Ou de Indiana Jones (estrelando Luciano Pavaroti):
Ou Fúria de Titãs, que nem o título original tem:
Tal como um puzzle abstrato mas absolutamente elaborado e coeso, A Beginner’s Mind é uma espécie de documento com hiperlinks infinitos que levam a caminhos cada vez mais caleidoscópicos. Sem deixar de lado sua imensa destreza musical e lírica, Stevens e De Augustine entregam uma obra memorável - visual e musicalmente.
Meu novo vício aleatório do YouTube é a exploração urbana de lugares abandonados. Conhecida como URBEX, a prática mais interessante acontece especialmente no leste europeu, repleta de instalações pós-soviéticas abandonadas. Minha recomendação é começar pelo canal Bald and Bankrupt explorando o sanatório stalinista. Na sequência, vale ver o anônimo Shiey investigando uma pequena cidade italiana abandonada por causa de um terremoto. Por fim, é imperdível o top 10 lugares mais perigosos visitados pelo canal Exploring The Unbeaten Path. Vale dizer, se não ficou claro, que trata-se no geral de explorações não autorizadas. O que geralmente garantem momentos de “eita, porr*!” nos vídeos.
Top 5 aleatório da semana
1. 7 Prisioneiros, filme brasileiro que chega em novembro na Netflix, está fazendo algum sucesso internacional no olhar para o Oscar 2022. O trailer já dá o clima.
2. Roberta Sá diz que está viciada em uma canção de Luisa Sonza e Marília Mendonça. Antes de torcer o nariz, vale o play. O cover é incrível.
3. Falando em covers incríveis, esse aqui de “Don’t Speak” (feito pelos sempre talentosos da Postmodern Jukebox) está imperdível.
4. O clássico jogo de estratégia em tempo real, Age of Empires, está de volta - agora em sua quarta versão. Com novo visual e algumas mecânicas atualizadas, parece promissor (e caro, por R$ 199,00).
5. E para fechar essa lista com perfeição, que tal uma versão soul da canção tema (versão brasileira) de Dragon Ball?
É isso, gente boa. Obrigado por acompanharem a Popcafé por 30 edições.
Um abraço,
Ricardo Oliveira
@ricardosemconteudo