Popcafé #21: o novo (e belíssimo) disco de Marisa Monte
Crônica de um coração arrebatado e de Portas abertas para Marisa Monte
Eu tinha 20 anos quando um par de discos absolutamente essenciais da música brasileira povoou horas e mais horas de algum player antigo no meu computador. Infinito Particular e Universo ao Meu Redor (especialmente este segundo) tocaram, tocaram e tocaram mais. Sabia de cor várias das bossinhas e pequenos sambas de Universo. Era Marisa Monte, já consagrada há tempos na música brasileira, que se tornava para mim a voz feminina definitiva da calmaria melancólica que canções como “Lágrimas e Tormentos” me traziam.
Não é muito diferente a sensação de frescor que sinto ao ouvir seu novo Portas, disco lançado neste 02 de julho nas plataformas digitais. Os tempos são outros e Marisa fez 54 anos no dia 01. Atualmente, por exemplo, você recebe da assessoria de imprensa os arquivos .WAV do álbum numa pasta no Google Drive, algo impensável em um 2006 em que “pirataria” ainda era um assunto.
“Portas” tem uma masterização de som corpulento, mas aberto e orgânico, com um reverb de sala que traz a constante sensação de estar ouvindo um show privado. A impressão de “disco ao vivo” se amplia com os pungentes arranjos de cordas, piano, percussão e contra-baixo.
Ouvindo no volume certo, é difícil que não se arrepie a alma e queira dançar em “Déjà Vu” (escrita com Chico Brown, com cordas de Arthur Verocai) ou enxugar os olhos em “Sal”, feita em parceria com Marcelo Camelo. Interessante pensar que depois da sua curiosa “Sinfonia nº 1”, Camelo agora também assine arranjos de cordas no disco da amiga. E como soam bem essas cordas, do começo ao fim. “Quanto Tempo” traz o tom “sinfônico” permeando uma levada de baixo e violão totalmente tradicional ao som de Marisa.
Lucas e Lúcio Silva (o Silva e seu irmão) retornam em nova parceria na deliciosa “Totalmente Seu”. Balada curta e arrebatada pelo romantismo soturno que Silva imprimiu em sua obra sem receio de referenciar a influência da cantora (afinal, tem um disco dele cantando suas preferidas dela). Já “A Língua dos Animais” (em parceria com Antunes e Dadi) se apresenta magistralmente, com aquele tom setentista, remetendo bastante a Belchior. Junto a “Pra Melhorar”, soam como canções em resposta ao isolamento pandêmico: “Vou sair para passear ao sol / Vou pisar / No capim”. “Espaçonaves” é uma bossa pronta para conquistar o mundo.
Claro, há parcerias mais “tradicionais”, como Arnaldo Antunes ou Chico Brown (filho de Carlinhos, herdando a cadeira cativa do pai). Mas é inegável o meu bairrismo geracional em dar mais atenção à vivacidade benjoriana que Marisa e Marcelo Camelo imprimiram em “Você Não Liga” (que tem um climão “acústico MTV”) com um conjunto de cordas cobrindo um samba-rock classudo.
Revelo isso sem muito receio porque há aqui um carinho específico por esses encontros. Camelo (43) e Marisa (54) são de gerações diferentes, mesmo que bebam das mesmas fontes. E eu, que sou da geração seguinte, vivi meus 20 e poucos ouvindo Los Hermanos e Marisa sem vê-los no mesmo estúdio. Agora estão (ainda que remotamente) e há uma beleza única nesse “universo particular”.
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Portas está disponível nas plataformas digitais e há uma versão visual do disco no YouTube da cantora, com vários registros das gravações.
Curtinhas de cinema e séries
O streaming HBO Max chegou ao Brasil no último dia 29 e, olha, vale a pena. Além do preço competitivo, o catálogo é bem generoso aos fãs de cinema e séries, incluindo vários clássicos. Fiz um apanhado neste vídeo modesto.
A AppleTV+ lançou o primeiro trailer oficial de Fundação (foto acima), série que adapta a clássica trilogia de livros de Isaac Asimov, lançada em 1950. E olha, impressiona.
Quentin Tarantino lançou uma versão romance de Era uma Vez em… Hollywood, seu último filme. É um catatau de 560 páginas e o booktrailer tem imagens…do filme, claro. A promessa é ampliar a narrativa e explicar mais detalhes da história, como a morte da esposa de Cliff Booth (Brad Pitt).
Top 5, rápido, rasteiro e realmente aleatório
1. O youtuber especializado em Flight Simulator que faz um tour de pistas de pouso de garimpeiros é peculiar.
2. O Foo Fighters foi a primeira banda a tocar no Madison Square Garden depois do fim da pandemia em Nova York. Um fã editou áudios e vídeos avulsos e está bem bom.
3. Aliás, Prince e sua banda tocando “Guitar” numa performance na TV é uma preciosidade.
4. Sabe aqueles russos com um tipo de nanismo que viralizaram no Instagram e TikTok brigando? O youtuber NFKRZ fez um apanhado sobre quem eles são (em inglês).
5. E no fim do mês estreia na Netflix a nova versão de He-Man. O trailer empolga.
Não vivemos tempos fáceis. Numa mistura absurda de sentimentos sobre o mundo e a iminência de ser pai nas próximas semanas, escrevi uma crônica em forma de carta para meu filho. O resultado está no catavento.me. Agradeço sua leitura.
Por hoje é isso, pessoas. Sigo infinitamente grato pela fidelidade de leitura de tantos de vocês semana a semana. Tem sido sempre especial preparar edições especiais como essa de hoje para vocês.
Um abraço
ps.: se cuidem.